sábado, 28 de julho de 2012

Os seios mandam desde sempre (Guardian)


Os seios mandam desde sempre


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ZOE WILLIAMS
DO "GUARDIAN"


Os seios mandam desde sempre








Você não vai se arrepender de ler "Breasts: A Naturaland Unnatural History" (seios: uma história natural e artificial). As vinhetas históricas são divertidas e poucas.
"As razões pelas quais os seios das mulheres ficam no peito", escreveu Henri de Mondeville ao rei da França no século 14, "enquanto outros animais mais frequentemente os têm em outros lugares, são de três tipos: Primeiro, o peito é um local nobre, notável e casto; logo, pode ser mostrado com decência; segundo, aquecidos pelo coração, os seios devolvem seu calor a ele, de modo que esse órgão se fortalece. A terceira razão se aplica apenas aos seios grandes, que, por cobrirem o peito, aquecem, recobrem e fortalecem o estômago." É como perguntar a uma criança de 3 anos o que ela pensa do sol.

Marisa Caduro/Folhapress
"Breasts: A Natural and Unnatural History", recém-publicado na Inglaterra, ainda não tem previsão de lançamento no Brasil
"Breasts: A Natural and Unnatural History", recém-publicado na Inglaterra, ainda não tem previsão de lançamento no Brasil
No mundo dos seios há muito mais território não mapeado do que existe discussão madura, mas, onde está última se manifestou, o livro de Florence Williams faz dela um resumo sólido e de leitura agradável.
A história começa com a biologia evolutiva: por que temos seios, para começar? A teoria da seleção sexual reza que os seios indicam saúde e juventude, de modo que um homem que se dispuser a olhá-los de perto terá menos probabilidade de desperdiçar seu sêmen em solo árido.
Isso pode explicar a suposta preferência dos homens por seios grandes, já que eles demonstram a passagem do tempo; os seios pequenos, menos suscetíveis à gravidade, poderiam induzir você ao equívoco horrendo de supor que uma mulher de 45 anos tem 35, e nesse caso são 300 milhões de pequenos nadadores que você nunca vai recuperar, homem das cavernas. É algo difícil de falsificar, já que --diferentemente dos polegares-- os seios não deixam registros fósseis.
Mas existem falhas evidentes no argumento, já que os estudos não demonstram nenhuma preferência masculina constante por um tamanho em detrimento de outro. Ademais, "se seios grandes e firmes mostram ao homem que a mulher é fértil e está preparada para o sexo, então por que os seios dela estariam maiores e mais firmes quando ela já está grávida ou é lactante?".
A partir do momento em que Williams formula essa pergunta, quase qualquer outra teoria passa a ser mais provável que a do seio assinalando aos homens onde podem investir sem perder tempo e sêmen. A antropóloga Gillian Bentley desenvolveu a teoria do "rosto chato": "Para que os recém-nascidos consigam passar por nossos quadris de bípedes, e estreitos, seus rostos precisam ser chatos. Rostos chatos e seios chatos não funcionam bem juntos."
Há a teoria do camelo, segundo a qual os seios são depósitos de gordura que tornam a fertilidade e lactação da mulher mais resiliente a períodos de fome. Há a teoria sobre a técnica específica de sugação suscitada pelo seio, que desenvolve os músculos necessários à fala.
MOTOR DE SOBREVIVÊNCIA
Williams se convence --e me convenceu-- de que os seios evoluíram como motor da sobrevivência das mulheres e dos bebês e que a obsessão dos homens com eles surgiu não concomitantemente, mas algum tempo mais tarde. "Talvez os seios estivessem mandando desde sempre", ela conclui.
Muitas suposições culturais são feitas sobre os seios, e Williams muito habilmente demonstra que quase todas estão erradas. O leite materno e a narrativa sobre a amamentação são um exemplo: o leite é representado como sendo puro, um meio pelo qual a dupla mãe-bebê pode evitar todas as toxinas da modernidade enquanto forma seu vínculo. Mas a composição do leite materno é um pouco mais complexa.
Ao enviar o dela a um laboratório alemão, Williams, que é americana, descobriu que seu leite apresentava níveis de retardadores de chama (uma classe de substâncias químicas que sabidamente se acumulam em gordura) dez a cem vezes mais altas que as de mulheres europeias. A composição do seio faz deste um ímã para toxinas ambientais, de modo que eles "carregam o ônus dos erros que cometemos no cuidado do planeta".
As entrevistas que Williams faz são extensas e amplas. Ela encontra Jean Lindsey, a primeira mulher a ter feito um implante moderno de silicone, e traz à tona a seguinte história divertida: "Me perguntaram se eu gostaria de fazer parte de um estudo sobre implantes". Lindsey diz que "nunca tinha pensado" sobre seus seios: "Eu estava satisfeita com o que tinha. Depois de seis filhos, acho que estavam um pouco caídos, sim. Falei 'sabe, o que eu queria realmente é fazer uma cirurgia para minhas orelhas de abano'. Eles disseram: 'ok, vamos arrumar suas orelhas também'."
Não apenas a pessoa parece estar ali ao seu lado, como há um retrato perfeito da manufatura da rejeição própria: como criar toda uma indústria de implantes de silicone? Como convencer as pessoas a odiar uma parte de seus corpos? É preciso fazer uma permuta com o ódio que elas já nutrem por outra parte do corpo. O capitalismo é realmente criativo.
Se há algo que decepciona neste livro sempre interessante, é o tom eternamente coloquial, que fica em algum lugar entre uma reportagem com notícias locais ("para entender porque nossos seios se ligam tão facilmente a moléculas mal afamadas, precisei aprender como funcionam as células") e um discurso feminista ultrapassado (Garotas! Ele deixou as meias jogadas no chão de novo? A cultura tentou aviltar seu status, atribuindo características falsas a suas características sexuais secundárias? Ou quem sabe ela simplesmente goste de seios!).
Todos os entrevistados têm suas roupas e seus cortes de cabelo descritos com detalhes desnecessários, especialmente quando se leva em conta que praticamente todos estavam vestindo camisa social e blazer bege. Esse tom de bate-papo visa tornar o livro mais acessível, mas apenas interrompe o fluxo de ideias e torna o texto mais difícil de ler. Mas é para isso que serve nossa função folhear, e a substância do livro se mostra ainda mais válida por isso.


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